Preliminarmente é importante esclarecer que o caso a seguir se refere a uma dissolução de União Estável, por isso são chamados de companheiros e não cônjuges, e que há (ao menos) um bem imóvel a ser partilhado. Não fica claro na notícia e nem no processo que discute a respeito do imóvel se os companheiros tinham uma Escritura Pública de União Estável ou se apenas constituíram esse status pelo preenchimento dos seus requisitos, quais sejam: objetivo de constituir família, relacionamento duradouro, publicidade, e não terem algum impedimento para se casar.
Isso é importante ser ressaltado, porque é nosso entendimento de que realizando uma dissolução de união estável (ou um divórcio, no caso de casamento) em que se resolve a partilha de bens, seja no Judiciário ou no Cartório, essas questões já podem ser debatidas de maneira prévia, evitando-se esse tipo de discussão futura.
Por isso, a assessoria jurídica nesse sentido é de grande importância. Pois, de nada adianta desfazer uma União Estável sem um procedimento adequado, por não ver necessidade naquele momento, mas passar a ter que ingressar com diversas ações esparsas para solucionar outras questões relacionadas ao que o casal construiu enquanto esteve junto.
Além disso, no caso em tela, houve um combinado entre o casal de que a mulher não precisaria pagar o aluguel até que o bem fosse vendido. Em casos de condomínio é comum que aquele que permanece no imóvel pague ao outro que não mais reside nele o valor da sua quota parte a título de indenização (como aluguel, no caso). Porém, se houve um combinado diferente, este deve ser respeitado, e o STJ entendeu nesse sentido, mesmo que venda esteja demorando para acontecer (4 anos).
Dito isto, passemos à notícia:
"A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o fato de um dos ex-companheiros residir com os filhos no antigo imóvel do casal, por si só, não é causa suficiente para afastar o direito do outro à extinção do condomínio.
Com esse entendimento, o colegiado reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) para permitir que o autor da ação venda o imóvel comum que possuía com a ex-companheira, adquirido mediante alienação fiduciária. Após a separação, ela ficou responsável pelo pagamento das prestações do financiamento e continuou residindo no imóvel com as duas filhas comuns.
O autor ajuizou a ação para vender o imóvel e para receber da antiga companheira os aluguéis pelo uso exclusivo do bem. O juízo de primeiro grau determinou a alienação, cujo produto deveria ser dividido igualmente entre os dois, e condenou a mulher a pagar os aluguéis referentes à fração do imóvel pertencente ao ex-companheiro.
No entanto, o TJPR, em nome do direito constitucional à moradia, afastou a possibilidade de alienação dos direitos relativos ao imóvel.
Separação impõe perda de padrão de vida
O relator do caso, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, afirmou que o TJPR concluiu pela prevalência dos interesses sociais advindos do direito de família, notadamente o direito constitucional à moradia, em relação ao direito de extinção do condomínio. Na sua avaliação, contudo, o acórdão merece reforma nesse ponto.
Segundo o ministro, o tribunal estadual entendeu que a ex-companheira teria prejuízos com a alienação, uma vez que é titular de apenas 50% dos direitos do imóvel e não conseguiria comprar outro do mesmo padrão apenas com os recursos da venda. "Constitui fato notório que, nos processos de separação ou divórcio, há uma natural perda do padrão de vida para todos os membros da família, procurando-se apenas estabelecer paliativos para equalizar essas perdas", disse.
Direito de dispor do bem é inerente à propriedade
O ministro lembrou o entendimento do STJ segundo o qual é direito potestativo do condômino promover a extinção do condomínio sobre bem imóvel indivisível, mediante alienação judicial. Aliado a isso, ele ressaltou que o Código Civil, em seu artigo 1.320, estabelece que é lícito ao condômino, a qualquer tempo, exigir a divisão da coisa comum.
O relator também verificou nos autos que o bem está na posse da ex-companheira há mais de quatro anos e, mesmo sendo anunciado para venda durante todo esse período, por motivos não esclarecidos no processo, não foi fechado nenhum negócio.
Em razão do tempo decorrido, Sanseverino considerou não ser razoável indeferir o pedido de alienação judicial, tendo em vista que a utilização exclusiva por parte da mulher impede seu ex-companheiro de dispor do imóvel. O entendimento adotado pelo TJPR – avaliou o ministro – retirou do autor da ação um dos atributos inerentes ao direito de propriedade, privando-o da possibilidade de dispor do bem que lhe pertence.
Cada condômino responde aos outros pelos frutos que recebeu do bem
Em relação ao aluguel que seria devido pela moradora do imóvel, o relator ressaltou que a jurisprudência do STJ se orienta no sentido de que, enquanto não dividido o imóvel, a propriedade do casal sobre o bem remanesce, sob as regras que regem o instituto do condomínio, notadamente aquela que estabelece que cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa, nos termos do artigo 1.319 do Código Civil.
"Se apenas um dos condôminos reside no imóvel, abre-se a via da indenização, mediante o pagamento de alugueres, àquele que se encontra privado da fruição da coisa", destacou.
Na hipótese em análise, contudo, no momento da dissolução da união estável foi combinado que a mulher ficaria residindo no imóvel, sem a necessidade de pagar por isso, até a venda do bem – o que, segundo o ministro, impede a cobrança de aluguel.
Leia o acórdão no REsp 1.852.807."
Assim, tem-se que foi permitida a alienação do imóvel, não sendo constituída à ex-companheira o preceito do direito real de habitação (que normalmente é concedido ao companheiro sobrevivente, no caso de falecimento do outro), instituto este que também entendemos ser diferente do caso em tela. Além disso, como já dito, foi respeitada a condição estabelecida entre os companheiros no momento da separação de que não seria cobrado aluguel daquele que permanecesse no imóvel, não sendo possível que essa situação seja alterada por desejo de uma das partes que está insatisfeita.
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#deolhonosTribunais. Fonte: Superior Tribunal de Justiça - STJ. Publicado em: 17/06/2022. Acesso em: 17/06/2022