Sobretudo, vamos esclarecer neste artigo pontos quanto ao reconhecimento da Covid-19 como doença ocupacional traçando uma linha temporal e como isso é, de fato, tratado pela Justiça do Trabalho, determinando suas consequências.
Em abril de 2020 o STF suspendeu o artigo 29 da MP 927/2020 que deixava de considerar como doença ocupacional os casos de contaminação de trabalhadores pela Covid-19. A decisão foi proferida no julgamento de medida liminar em sete Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) ajuizadas contra a MP.
Nesse sentido, a portaria n º 2.309, de 28 de agosto de 2020 alterou a Portaria de Consolidação nº 5/GM/MS, de 28 de setembro de 2017, e atualizou a Lista de Doenças Relacionadas ao Trabalho (LDRT), incluindo o Coronavírus SARS-Co V-2 em atividades de trabalho como doença ocupacional.
Sendo assim, se houver uma controvérsia a respeito da contaminação, é do empregador o ônus de provar que tomou todas as medidas de prevenção para que o empregado não adquirisse a doença do trabalho.
Foi exatamente essa falta de comprovação de eventuais medidas preventivas no ambiente de trabalho dos Correios em SP na Ação Civil Pública movida pelo Sindicato dos Trabalhadores da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (Sintect), que levou ao reconhecimento da natureza ocupacional da Covid pela Justiça de Trabalho de SP (TRT-2).
Em primeira instância o Juiz da Vara do Trabalho de Poá-SP acolheu o pedido de tutela de urgência do autor da ação, determinando que os Correios realizassem testes para detecção da Covid-19 em todos os seus empregados da unidade, bem como a adoção de diversas medidas de prevenção, como desinfecção do ambiente de trabalho e afastamento dos empregados com suspeita de contágio, mantendo-os em trabalho remoto. Entre outras medidas, impôs multa diária de R$ 2.000,00, limitada a 30 dias, em caso de descumprimento.
"Tendo em conta o contágio na mesma época (de seis empregados), aliado ao fato de a ré não ter tomado todas as cautelas para prevenção da contaminação da doença, é muito provável que o contágio se deu em razão do labor da reclamada, tendo em conta a maior exposição ao risco, podendo-se presumir o nexo causal em razão das especiais condições de trabalho dos empregados."
O magistrado ressaltou que, embora não haja prova cabal do nexo causal, também não há prova de que a doença foi adquirida pelos empregados fora do ambiente de trabalho, se tratando de hipótese de falta de esclarecimento dos fatos.
"Por isso, não se pode resolver o caso pela regra de distribuição do ônus da prova, pois nenhuma das partes teria condição de fazer prova da existência ou da inexistência do nexo causal, razão pela qual a decisão deve ser tomada a partir dos elementos indiciários existentes no processo, por convicção de verossimilhança".
A empresa interpôs recurso ordinário, o qual foi julgado pela 9ª Turma do TRT-2, que manteve a sentença na íntegra.
A Desembargadora-relatora Valéria Pedroso de Morais ainda ressaltou:
“pelo conjunto probatório e pelo que se discute nos autos, concluo que efetivamente a ré não tomou a tempo e modo, todas as cautelas e medidas para a prevenção da contaminação da doença no ambiente de trabalho”.
Por fim, os Correios realizaram o teste em 27 empregados que trabalhavam no setor, sendo que outros cinco testaram positivo para covid-19.
Mas afinal, por que a Covid-19 foi considerada doença do trabalho?
A doença ocupacional ou do trabalho é assim chamada por ser uma doença que se adquire no ambiente de trabalho. Sendo assim, deve haver esse nexo causal entre a doença e a contaminação no local de trabalho, que no caso do Coronavírus já é pressuposta por conta da portaria n º 2.309, ou seja, alegado que a doença foi constituída no ambiente do trabalho, pressupõe-se que o fato seja verdadeiro até que a empresa prove o contrário.
Assim, o ônus probatório é do empregador, que deverá demonstrar que adotou todas as medidas preventivas dentro do ambiente laboral a fim de evitar consideravelmente a proliferação do vírus entre seus empregados enquanto ali estiverem.
Quais os direitos do empregado que teve reconhecido como doença do trabalho a contaminação pela Covid-19?
O empregado passa a ter direito ao afastamento, sendo que nos 15 primeiros dias o empregador deve continuar pagando o seu salário e, a partir do 16º dia, o empregado passa a receber o auxílio-doença pelo INSS.
Se o afastamento for superior a 15 dias, no seu retorno, o empregado tem estabilidade por 1 ano contado do retorno.
Além disso, se o empregado ficar com sequelas materiais e/ou morais, o empregador fica obrigado a indenizá-lo.
Quais outras consequências o empregador pode sofrer em caso de transmissão de Covid-19 em local de trabalho?
O empregador pode sofrer um apenamento de natureza tributária, aumentando a alíquota SAT E FAT, que são tributos recolhidos ao Governo Federal em virtude dos acidentes de trabalho ocorridos na empresa.
Por esses motivos, tomar medidas preventivas e protetivas nesta fase pandêmica que ainda estamos vivenciando é de extrema importância, haja vista os aspectos humanitários envolvidos, bem como pelo fato de o empregador estar sujeito a penalidades e custos com indenizações.
*Artigo escrito por Renata de Oliveira Ferreira. Advogada. Especialista em Direito Processual Civil. Atuante nas áreas cível, empresarial, trabalhista empresarial e consultoria jurídica.
Ficou com alguma dúvida ou precisa de auxílio jurídico em um caso parecido? Nós do WAOF contamos com uma equipe especializada pronta para te atender!
Artigos relacionados: